Não me lembro do canário-da-terra-verdadeiro (Sicalis flaveola) antes da sua nova
ascensão. Sabia da sua existência apenas em viveiros e gaiolas. Foi considerada
uma espécie quase que extinta por aqui, no sul de Minas, muito visada e caçada
devido ao seu grande apelo canoro e principalmente, pela sua linda plumagem
amarelada, exclusiva do macho. É considerada entre as 10 mais apreendidas
segundo relatórios do IBAMA. Tal característica marcante do amarelo lhe rendeu
o posto de mascote da seleção brasileira de futebol com o slogan "seleção
canarinho", muito bem explorado pela seleção de 1982.
Seu desaparecimento na época, deu-se por conta também, da
intoxicação pelo uso abusivo de agrotóxico nas lavouras, já que o
canário-da-terra é uma espécie
granívora, ou seja, alimenta-se de sementes, especialmente sementes de capins.
É muito comum vê-los se alimentando em capinzeiros e pastagens de beira de
estrada junto às coleirinhas, bigodinhos e tizius. Houve um tempo, em alguns
lugares do sul de Minas que a lavoura de arroz foi dominante nas áreas mais
alagadas. Talvez ali, tal fato foi preponderante para o desaparecimento da
espécie devido ao uso do roundup glifosato.
No entanto, o fato é que o "canarinho" voltou, e
com força total! A ponto de ocupar e disputar espaço com o pardal! Suas
populações têm aumentado exponencialmente, principalmente em locais de grande
movimentação humana nas zonas rurais onde o manejo de criações tornou-se o seu
principal reduto por conta do trato de animais a base de grãos.
Nas cidades, sua movimentação é mais discreta, porém já se
ouve em qualquer esquina. É comum acordar de manhã e passear pelas ruas e
avistar um casal se alimentando.
O que o trouxe de volta? Em minha região, a uns 10 anos
atrás, dificilmente se via canários nas cidades. Avistava-se eventualmente nas
zonas rurais. A uns 20 anos então, não se via em lugar algum. As pessoas foram
criando em cativeiro com o intuito de soltá-los gradualmente, principalmente
proprietários de terra e donos de xácaras que aderiram à ideia e foram
disseminando-a. O bicho foi se espalhando para todo canto com uma capacidade de
reprodução incrível e grande habilidade em ocupação de espaço, basta pendurar
uma cabacinha que logo já se vê uma fêmea fazendo o reconhecimento da futura
chocadeira.
É bem verdade, as Leis punitivas foram ficando mais
rigorosas, embora ainda bem longe do ideal. O canarinho é tão querido que hoje
se teme o fato do sujeito ser "dedurado" caso opte por caçá-lo e
criá-lo em gaiola.
Segundo relatos de pessoas mais velhas, que já viveram o
auge da espécie em outras épocas, o canário-da-terra de hoje voltou do
cativeiro um pouco modificado em relação aos seus hábitos originais. O canário
de hoje tem hábitos bem mais gregários, certamente por ter sido criado aos
montes em cativeiro. Inclusive, segundo relatos desses mais antigos
passarinheiros o seu canto voltou um pouco modificado. O fato é que ainda
assim, já consegui ver disputas acirradas de machos por fêmeas em períodos
reprodutivos onde é muito comum ver casais separados do bando.
Sua ocupação ostensiva não gera impacto, muito pelo
contrário, é possível perceber o quanto a sua ascensão ajudou a controlar o
ímpeto do pardal e das pombas, equilibrando assim as populações da avifauna
urbana e rural. A presença do canário-da-terra nos inspira felicidade! Ao
ouvi-lo solto nos dá a sensação de paz, pois sua presença purifica o ambiente
de beleza e nos remete ao campo, em plena selva de pedra.